Mulher sendo preparada para um apedrejamento, culpada por “adultério”. Mas tudo bem, não é mesmo? Afinal, é a lei.
“A Indonésia sim que é um modelo de correção e cumprimento às leis. Lá os criminosos não ficam impunes.” ─ Frase repetida milhares de vezes nos últimos dias por conta do fuzilamento de Marcelo Archer.
É mesmo?
Em
uma das minhas entradas no país tive que dar meu telefone para o agente
da imigração, que ameaçou retê-lo caso eu não liberasse o número.
Vários amigos tiveram bolsas abertas na salinha da imigração. “Ah,
brasileiro? Meu filho adora futebol. Vai gostar muito dessa camiseta do
Ronaldo”. Pegavam, numa boa, e saíam fora. São muitas as histórias.
A corrupção é tão institucionalizada que, quando tu tá por lá, tu enxerga ela todos os dias. To-dos.
Diversas
vezes me aconselharam a sair de casa com uma quantia mais significativa
de dinheiro pra “caso a polícia encrencar contigo”. E aí tem gente
aplaudindo a Indonésia como um país que cumpre as leis e mostra como é
que é quando alguém não as cumpre.
Tentei muito sem sucesso expor esse ponto de vista em uma discussão
nesse fim de semana. A lei sobreposta à vida dessa forma, sem
questionamento, sem crítica, soberana apenas por ser lei acaba
legitimando qualquer loucura — desde que seja proveniente de um
legislador. “É lei”. Sim, é lei e é ótimo que as leis sejam cumpridas,
mas tem tanta coisa ruim que se pode fazer dentro da lei…
Me disseram, também, que “as leis de um país refletem a cultura daquele país e a vontade das pessoas”.
Não sei o que é mais ingênuo: realmente acreditar que as leis refletem a
vontade do povo ou crer que elas estão acima do bem e do mal pelo
simples fato de serem leis.
Quando eu morava na Malásia, um morador do meu prédio me quis presa. O
motivo: um amigo meu me encontrou no saguão. Ele chorava, desesperado,
com um problema pessoal. Eu abracei o guri pra consolá-lo. Um abraço, e o
cara me queria na cadeia. As leis, as interpretações das pessoas, os
absurdos.
Que mal eu causei com um abraço? Feri a moral & os bons costumes de
uma sociedade majoritariamente muçulmana que acredita que isso possa ser
uma afronta social.
Sem falar no fato de que ser homossexual é crime em alguns países e, por
isso, se eu sou gay e tenho fascinação pelo Oriente Médio, que eu passe
a vida sem conhecê-lo, porque, bueno, gosto de meninas? Você acha que gays devem levar chibatadas pelo fato de serem gays? Não faz nem um pouco de sentido.
Minha intenção aqui é só agregar uma única coisa ao debate: não, a
Indonésia não é nenhum tipo de exemplo de correção (e mesmo se fosse,
isso não faria com que as leis de lá fossem inabaláveis pelo simples fato de serem leis).
Fonte: Medium Brasil
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