"Manualzinho para pessoas (cis) aliadas poderem nos ajudar a combater o cissexismo e a transfobia
Use o termo "cisgênero" quando for se referir a pessoas não-trans, em vez de termos transfóbicos como "normal" (que sugere que pessoas trans são anormais, estranhas ou doentes), "mulher/homem biológique" e/ou "mulher/homem de verdade" (os quais sugerem que homens/mulheres trans são menos legitimes que homens/mulheres cis).
Evite dizer que determinadas partes anatômicas/características biológicas pertencem ao homem e outras à mulher. Isso é cissexismo. Há homens e mulheres que possuem útero, assim como há homens e mulheres que possuem testículos, por exemplo. Nenhuma característica anatômica é exclusiva de nenhum gênero. "Voz de homem", "pé de moça", exclua tudo.
Evite dizer que pessoas trans possuem caracteres sexuais masculinos/femininos (ex: é uma mulher com genitais/cromossomos masculinos). Se uma pessoa é mulher, tudo o que está nela é de mulher, inclusive o pênis e os cromossomos. Abandone "sexo biológico masculino" e "sexo biológico feminino" para se referir a gônadas, orgãos sexuais e cromossomos de pessoas designadas homens e mulheres no nascimento, respectivamente.
Não diga que as pessoas nascem com um gênero/sexo (ex: nasceu homem/com sexo masculino). Nós não nascemos com um gênero/sexo. Nascemos com um corpo e somos designados homens ou mulheres. Utilize "foi designado homem/mulher no momento do nascimento" ao invés de "nasceu homem/mulher".
Não faça uso de insultos transfóbicos, como "tranny", "shemale", "traveco/traveca", "trava", "ladyboy", "trap", "cilada", "sissy", "boneca", "t-girl", "t-boy", "transex/transexy", "piroco". Essas palavras insultam e causam danos à pessoas trans.
Sempre trate a pessoa pelo nome que ela te der e jamais pergunte qual é o seu nome real. O nome que a pessoa apresentar e desejar ser chamada é o seu nome real.
Sempre trate a pessoa pelos pronomes que ela desejar. Se você não tem certeza sobre qual pronome usar, pergunte a pessoa, discretamente, qual pronome ela prefere ou então aguarde até que a pessoa se auto-defina utilizando determinado pronome.
Nunca diga que a identidade de gênero de uma pessoa é falsa, não-existente, imoral ou consequência de uma doença/trauma.
Jamais diga que a pessoa está confusa ou que é apenas uma fase.
Não faça perguntas sobre os corpos de pessoas trans. Evite perguntar a essas pessoas se elas desejam alterar uma ou outra característica. É completamente desconfortável falar sobre isso, principalmente quando se tem disforia.
Não peça para ver fotos de antes da transição, infância ou adolescência. Também evite perguntas invasivas e pessoais sobre o passado de pessoas trans. Reviver o passado pode ser doloroso para essas pessoas.
Nunca diga que alguém é trans para es outros, deixe sempre que a própria pessoa sinta-se confortável para dizer isso, caso ela ache necessário. E também evite perguntar se essa ou aquela pessoa é transgênero. Ter a sua identidade de gênero posta sob questionamentos, além de cissexista, é completamente desconfortável.
Não diga a uma pessoa que ela não parece/parece trans ou que ela não parece/parece homem/mulher. Julgar a identidade de gênero de alguém com base em características físicas é cissexismo.
Jamais suponha a orientação sexual de alguém com base em sua identidade de gênero. Qualquer pessoa, independentemente de sua identidade de gênero, poderá apresentar qualquer orientação sexual.
Se você não se relacionaria/vê problemas em se relacionar afetivo-sexualmente com pessoas trans, em função dos genitais que possuem, sempre há a possibilidade de problematizar essa preferência e buscar desconstrução. Se você não estiver apte a desconstruir, jamais diga que você só se relacionaria pessoas cis porque é "questão de gosto": não torne isso público em um espaço em que pessoas trans estiverem presentes, pois pode ser um ativador de gatilho. É completamente doloroso saber que há pessoas que preferem não se relacionar com você em função de algumas características que você possui.
Não seja binarista: Lembre-se sempre que existem outros gêneros além de homem e mulher, ele e ela. Ao dirigir o seu discurso a varias pessoas (as quais você desconhece o gênero), dê preferência ao tratamento neutro.
Evite o termo "mudança de sexo" ao se referir a cirurgia de redesignação genital. Não nascemos com nenhum gênero/sexo e nossa auto-identificação é quem definirá o nosso gênero/sexo, portanto, não há sexo pra ser mudado, somos o que somos independentemente de qualquer alteração física que optarmos por fazer. O genital da mulher trans, por exemplo, já é feminino mesmo antes da cirurgia, porque ela é uma mulher. Se você quer falar de mudanças corporais pelas quais pessoas trans passam, em especial a que envolve os genitais, use "redesignação genital/de orgãos genitais" ou "transgenitalização"
Às pessoas feministas: Ao serem misandriques, evitem fazer referência a características físicas do homem cis (ex: "tudo culpa dos cromossomos XY"; "pênis é a coisa mais horrorosa do mundo"): Lembrem-se que essas características também estão presentes em muitas mulheres trans/travestis e pessoas não-binárias designadas homens no nascimento e isso poderá atingi-las também "por tabela", ativando gatilhos.
Ao utilizar linguagem neutra, abandone o X/@ (ex: elx, el@), X e @ são restritos a língua escrita, são impronunciáveis, portanto, não irão alterar a forma como falamos. Sem contar que o X/@ não é acessível para programas leitores de tela que auxiliam pessoas com deficiência visual. Utilize termos neutros (ex: eles não conseguirão -> essas pessoas não conseguirão) ou então substitua por letras pronunciáveis (ex: lindos -> lindes).
Abandone o uso do asterisco (ex: pessoas trans*). O termo "trans", por si só, sem asterisco, já engloba todas as identidades trans (binárias e não-binárias). O uso do asterisco, portanto, dá a entender que algumas identidades trans são mais trans/legitimas do que outras. Ao falar de homens enquanto sujeitos de opressão, faça a distinção cis-trans (ex: homens se beneficiam do machismo -> homens cis se beneficiam do machismo).
Lembrem-se que homens trans foram socializados mulheres e também sofrem com o cissexismo e a transfobia, portanto, apesar de homens, essas pessoas não detêm os mesmos privilégios que o homem cis.
Sempre que for falar de mulheres ou homens, mulheres e homens trans já estão inclusos nisso. Jamais use mulher/homem como sinônimo de mulher/homem cis. Sempre que for falar de uma especificidade da mulher cis, por exemplo, faça a distinção cis-trans, ao invés de dizer apenas "mulher". Ex: "mulheres engravidam -> mulheres cis engravidam". No caso, como engravidar se trata de uma especificidade da mulher cis, utilizar "cis" pra diferenciar.
Não há a necessidade de usar "trans" SEMPRE que você for se referir a uma pessoa trans. Ex: "divido o quarto com uma menina trans". Só é necessário você fazer a separação cis-trans quando seu objetivo for tratar de especificidades de cada ume. Ex: "mulheres trans sofrem na escola pois teem sua identidade de gênero deslegitimada". Com mulheres cis não ocorre a mesma coisa, portanto, trata-se de uma especificidade das mulheres trans. Só use quando for necessário. "Trans" não é genero, é apenas indicativo de condição. Também evite: 1° "A/o trans" ou "a/o transsexual", quando for se referir a mulheres/homens trans, como se esse fosse o nosso gênero. Nós temos um gênero. Quer se referir a mulheres ou homens trans? Use "a mulheres trans" e "o homem trans"; 2° "Mulheres, homens e trans". "Trans" não é homólogo a mulheres e homens, trans não é gênero, portanto, emprega-se um tratamento diferenciado. Procure estabelecer uma homologia: "cis e trans"; "pessoas cis e pessoas trans"; "homens, mulheres e gêneros não-binários". E lembre-se sempre que ao falar de mulheres e homens, mulheres e homens trans já estão inclusos nisso.
Um relacionamento entre um homem (cis ou trans) e uma mulher (cis ou trans) é um relacionamento heterossexual. Um relacionamento entre uma mulher (cis ou trans) e outra mulher (cis ou trans) ou entre um homem (cis ou trans) e outro homem (cis ou trans) é um relacionamento homossexual."
Texto escrito em linguagem neutra por Gabriella Kristinne
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