Sim, é possível. Esses dias tive
certeza de que é possível educarmos crianças de uma forma não
heteronormativa. Mesmo que o mundo esteja repleto de preconceitos e que a
escola, infelizmente, ainda seja um ambiente onde pouco, ou quase nada,
se discute sobre heteronormatividade. Mesmo que haja tanta resistência
em se tocar no assunto, e um simples beijo entre duas atrizes na novela
causem pânico nos mais conservadores, que querem tirar as crianças
correndo da sala. Mesmo que. É possível se mudarmos as nossas posturas
com as crianças que criamos ou convivemos. É possível se o diálogo for
aberto, se não houverem barreiras, mentiras, nem nada escondido. Se a
sexualidade for tema a ser transitado com cuidado e com os braços
abertos para as possibilidades. Porque sexualidade é isso aí:
possibilidades.
Esse final de semana meu filho e sua
inseparável amiga Sol conversavam conosco. Papo vai, papo vem, domingo
quente, todo mundo se preparando para nadar no lago. Amenidades de uma
manhã de claridades. No meio da prosa ela fala: “Be, quando você tiver
um namorado ou uma namorada você vai …..”. Segue o assunto. Ele
responde: “Não Sol, quando eu tiver um namorado ou uma namorada eu não
vou….”. Elxs terminam o sorvete e saem correndo em outras brincadeiras
despreocupadas. Um detalhe tão fundamental passou totalmente
desapercebido por suas meninices, mas fez a mãe aqui abrir um sorriso
maior que o sol que brilhava lá fora.
Elxs, aos 8 anos, conversam sem saber
que não fazem mais distinção de gênero nem sexualidade nas suas
projeções de futuro. Que, aos 8 anos, naturalizaram algo que nós,
criadxs em tempos repressores, demoramos tanto tempo para desconstruir:
que a sexualidade é livre. Que elxs, quando crescerem, poderão namorar
quem quiserem, como quiserem, sem que ser hétero ou ser qualquer coisa
seja uma exigência ou um padrão a ser seguido, que os machucará caso
queiram seguir o não padrão. Claro que terão que enfrentar também o
preconceito, caso escolham o caminho homo. Ou o caminho bi. Ou o caminho
trans. Ou qualquer outro caminho que não podemos ainda nominar. Mas, ao
menos, terão base e apoio para serem mais seguros e amados em suas
escolhas. Inclusive por elxs mesmos.
Sim, é possível, basta coragem. Basta
ousarmos. Sairmos do discurso e colocarmos as mãos na massa. Nós, pais,
cuidadores, mães, avós, madrinhas, tias, tios, podemos mudar as nossas
condutas em relação à educação sexual e afetiva dessas crianças.
Educarmos abertamente, assumindo-nos como seres possíveis. E elxs
também, sem essa de menino e menina, “com quem será que o Bernardo vai
casar? ah, claro, com a Rosinha. Nunca pode ser com o Pedrinho. Ou quem
sabe com o Pedrinho e a Rosinha também?.” As pessoas homoafetivas não
são aquelas lá longe, elas estão perto. E podem ser qualquer umx de nós,
a qualquer tempo. Pode ser ela ou ele, pode ser a gente mesmo. As
crianças assim criadas e educadas não vão necessariamente viver uma vida
homoafetiva. Elas terão a possibilidade, a escolha mais ampla, os
caminhos sem tantas nuvens e obstáculos consigo mesmas. E os braços
abertos para aceitar a diversidade de amor, sexo e afeto, venha de onde
vier. Bora desconstruir?
Visto no: Editorial Biscate
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