Homossexualidade vira tema no rap brasileiro nas letras de Rico Dalasam e Luana Hansen

Artistas representantes da comunidade LGBT admitem que ambiente é desfavorável à causa


Uma das principais alternativas para jovens negros e pobres das periferias brasileiras, o rap sempre foi um gênero em que temas como preconceito, opressão e segregação foram abordados com naturalidade. Porém, um assunto parece passar longe das letras de hip hop no Brasil: homossexualidade. Mas a coisa parece estar mudando, graças a artistas como Rico DalasamLuana Hansen Flávio Renegado.

Em meados de dezembro, o rapper paulista Rico Dalasam lançou o clipe deAceite-C, ode à saída do armário, em que canta: "boy, vim para ser seu man" e "ainda dá tempo de ser quem se é, tempo de ser quem se quer, deixa quem quiser falar". Para janeiro, ele prepara o lançamento de um EP – enquanto o disco não sai, ele disponibiliza faixas em sua conta no Soundcloud.

– No início, eu pensava que, para poder existir, teria que ficar na minha, fazendo rima sobre a vida no meu bairro, como os caras fazem. Com o tempo, eu vi que talvez desse para ser, sim, o Rico Dalasam, e cantar sobre o que eu queria. No meu discurso, quero promover um novo senso de normatividade, trazer essa nova ideia do "normal". E, como em qualquer lugar, existe preconceito, existe rejeição – conta o cara, que, aos 25 anos, tem no seu currículo participações frequentes na Batalha da Santa Cruz, de onde saíram nomes como Emicida.

Um pouco antes de Dalasam, outro artista havia aberto os olhos de quem vive o hip hop para o preconceito por orientação sexual. Foi Flávio Renegado, artista mineiro que transita entre o samba, o rap e a MPB, que lançou o clipe de Apenas um Beijo – nos versos, ele questiona: "me diz o que te ofende mais: ele beijando uma pretinha ou outro rapaz?"

– A gente vai ficando velho e começa a prestar atenção em coisas que não prestava. Essa molecada da nova geração, entre 20 e 26 anos, lida com a homossexualidade e com a bissexualidade de uma maneira que a minha geração não lidou. Às vezes, a gente é preconceituoso sem nem perceber. E já passou a fase de achar normal o preconceito. Acho que a gente tem que combater isso de todas as formas possíveis, e a minha forma é a música – explica o mineiro.

De acordo com Flávio, que em maio lançou seu DVD Suave Ao Vivo, muitas vezes o hip hop reproduz a opressão sofrida por seus artistas:

– Nós, que viemos da comunidade, somos muito excluídos. E não podemos continuar repetindo a posição de opressor, de continuar segregando, temos que agregar. Eu sinto que a galera ainda tem receio de se assumir, de falar, e isso é muito doido, que haja esse atrito, esse embate.

E a exposição da orientação sexual pode, mesmo, causar prejuízos. Quem garante é a rapper paulista Luana Hansen. Ex-membro do grupo A-TAL, ela foi vencedora do principal prêmio de rap no país, o Hutúz, e participou do filmeAntônia. Depois que saiu do armário, viu os convites para apresentações escassearem e as oportunidades de contratos e parcerias desaparecerem. Resolveu se tornar totalmente independente – hoje, tornou-se DJ, produtora, dona de estúdio e MC, tudo ao mesmo tempo.

– Já tive que mudar letra no estúdio, para poder entrar no padrão. Nêgo falava "acho que não era bem isso que você queria dizer, né?" e eu respondia "ah, é, não é bem isso". Hoje em dia, eu quero falar que eu amo "ela" e ter essa liberdade. Mas só consegui trabalhar do jeito que eu trabalho quando criei meu próprio estúdio. Cheguei a ouvir coisas como "você não vai conseguir chegar onde quer porque você é lésbica" – conta Luana, que também tem letras abordando feminismo, aborto e violência contra a mulher.

Ainda que o movimento esteja aumentando, Luana não acredita em melhores chances para rappers assumidamente gays no Brasil. Para ela, ainda são esparsos e pontuais os exemplos de artistas que levantam a bandeira:

– As coisas vêm mudando por causa de algumas pessoas que quiseram mudar, mas tem muito o que evoluir, em muitos sentidos. O rap é tão fechado que ainda é difícil ver uma mulher rimando. O que está acontecendo são pessoas que acreditam no seu trabalho e saem do armário, botam a cara a bater.


Fonte: Zero Hora

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